A incidência de correção monetária em créditos de IPI

Este artigo aborda tema simples sobre o qual os Tribunais Superiores já têm entendimento pacificado: a aplicação de correção monetária a créditos de IPI. É comum, contudo, a confusão feita na hora de determinar a natureza jurídica do crédito a ser restituído, o que pede alguma atenção, tanto de advogados quanto de julgadores, aos detalhes da matéria.

Há na origem uma equação comum: imaginemos o contribuinte como empresa que produz mercadorias beneficiadas pela isenção do IPI, mas que na fase inicial de produção adquire materiais e insumos, estes tributados pelo IPI na entrada. O recolhimento antecipado do IPI sobre produtos isentos gera crédito tributário a favor do contribuinte, denominado crédito-prêmio de IPI.

Esse crédito é regulado pelo Decreto-Lei nº 1.335/74, que determina que o valor apurado a titulo de crédito-prêmio pode ser compensado com novos débitos do mesmo tributo: a empresa pagou o imposto sobre produto isento, podendo então utilizar esse crédito para abater o imposto incidente sobre outras mercadorias não isentas que a mesma empresa produza. Muitas vezes, porém, a empresa detentora de tais créditos não tem como utilizá-los por via de compensação, eis que seus produtos não estão sujeitos ao mesmo tributo, porque (a) isentos, (b) não tributados ou (c) tributados à alíquota zero. Para essas situações aplica-se o disposto na Portaria 322/80, editada pelo Ministério da Fazenda, a dizer que na impossibilidade de compensação o contribuinte pode requerer o ressarcimento do crédito em espécie.

Essas duas possibilidades – compensação e ressarcimento – geram tipos distintos de créditos. O primeiro é denominado crédito escritural enquanto o segundo é tratado como crédito objeto do pedido de ressarcimento. No primeiro caso a regra geral impõe o descabimento da correção monetária; já no segundo caso, ocorrentes as situações previstas, a correção monetária deve ser aplicada.

Isso porque no que se refere ao crédito escritural (objeto de compensação) é cediça a não incidência da correção – caso não haja resistência injustificada do fisco em seu aproveitamento – já que, lançado na escrita fiscal da empresa, o referido crédito pode ser utilizado desde logo para abater o imposto devido por outro produto, ou em períodos de apuração subsequentes, ficando a critério do contribuinte fazê-lo ou postergá-lo. Optando o próprio contribuinte por postergar a compensação, não há como cogitar da correção.

Situação diversa ocorre com o crédito objeto de pedido de ressarcimento, eis que o contribuinte fica sujeito à burocracia e à lentidão do fisco, não sendo correto, neste caso, que o valor a que tem direito se deteriore pelo decurso do tempo.

Essa é a regra geral, destacando-se que em ambos os casos existem peculiaridades que precisam ser verificadas. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é pacífica quanto ao tema que se encontra, hoje, sumulado.

Uma questão adjacente ao tema, mas de igual importância, é a infraconstitucionalidade da matéria: correção monetária.
Por diversas vezes o Supremo Tribunal Federal posicionou-se no sentido de que o tema da correção monetária é de cunho estritamente ordinário, e seu desfecho há de dar-se no Superior Tribunal de Justiça, não no próprio STF.

A Corte Suprema já disse por mais de uma vez que a “incidência de correção monetária sobre créditos escriturais do IPI é tema afeto à análise da matéria infraconstitucional de regência. Precedentes: RE n.º 496.757, Primeira Turma, Relator o Ministro Ricardo Lewandowski, DJe de 19.09.08, e RE n.º 495.789-AgR, Segunda Turma, Relator o Ministro Eros Grau, DJe de 13.11.09.”

Em razão das decisões reiteradas das cortes superiores, a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional emitiu orientação, por meio da Nota PGFN/CRJ 775/2014 declarando:

“[…] a jurisprudência do STF e do STJ consolidou-se no sentido de que a atualização monetária do crédito escritural do IPI, entendido como aquele oportunamente lançado pelo contribuinte em sua escritura contábil para fins de abatimento desse mesmo tributo em outro período de apuração, decorrente do princípio da não-cumulatividade, não é cabível se não houver previsão legal, mas incidirá caso haja, por parte do Fisco, impedimento injustificado para o referido abatimento. [Para o crédito] objeto de pedido de ressarcimento, se tais créditos são reconhecidos pelo Fisco com mora, essa demora enseja a incidência de correção monetária, por restar caracterizada a ‘resistência ilegítima’. Nesse último caso, considera-se o Fisco em mora a partir da data do protocolo dos pedidos de ressarcimento. […] certo é que é pacífica a jurisprudência do STF no sentido de ser cabível a correção monetária dos créditos escriturais quando há resistência ilegítima por parte do Fisco. Para os créditos objeto de pedido de ressarcimento, a Corte Suprema entende que se trata de matéria infraconstitucional e, assim, eventual ofensa à Constituição seria meramente reflexa, o que não autoriza a análise do recurso extraordinário. Portanto, não mais se justifica a interposição de recurso extraordinário quanto ao tema e, consequentemente, não mais se sustenta a ressalva contida na Lista de Dispensa de contestar e recorrer da PGFN, já mencionada.”

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça distingue com didática exemplar as duas espécies de crédito e, em qualquer dos casos, defrontamo-nos com matéria infraconstitucional – a incidência de correção monetária – a ser tratada pelo Superior Tribunal de Justiça, não pelo Supremo.

As características de cada crédito, e a ação ou inércia das partes (fisco e contribuinte), fazem com que ele esteja ou não sujeito à incidência da correção monetária.

 

Francisco José de Castro Rezek é um dos sócios-fundadores da Francisco Rezek Sociedade de Advogados.
É advogado formado pela Faculdade de Direito da Universidade Mackenzie e especializado em Direito Tributário.

 

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